a memoria é a arma para a sobrevivência
“se você perdesse a memória, o que contariam sobre você?”
no desafio de escrita que planejei o tema é “se você perdesse a memória, o que contariam sobre você?”
me peguei pensando nisso enquanto reassistia little fish, já tenho um texto sobre ele aqui, mas, no filme as pessoas perdem a memória.
sem nossas memórias não saberíamos nem como voltar pra casa.
enquanto a emma criava recordações do seu marido jude, ela foi moldando tudo sobre ele a partir da visão dela.
e fiquei pensando o que me contariam se eu perdesse a memória, quais seriam as coisas que diriam ao meu respeito, que histórias contariam?
perguntei à alguns amigos e as respostas foram: te contaria que é escritora, que gosta de fotografia, que é fã dos seus artistas favoritos, que gosta de tal musica e tais filmes, que é uma boa ouvinte e boa amiga.
boas respostas até, mas eles não me diriam as coisas importantes, as coisas que me fazem ser eu, as coisas que guardo pra mim.
uma menina me perguntou sobre minha cor favorita e o porquê dela ser a minha favorita, e eu gostaria que me contassem que minha cor favorita é verde porque me lembra árvores. e as árvores são minha obsessão, que eu sorrio sempre que vejo uma, não importa o motivo, que eu fotografo a mesma árvore toda vez que passo por ela pois sinto que ela tem algo de diferente para me contar.
eles não me diriam que eu sou apaixonada por todo tipo de gestos de amor, e que o amor é o assunto que eu mais gosto de falar. não saberiam dizer que cozinhar é a única coisa que ao mesmo tempo me deixa triste e feliz. não me diriam também as coisas ruins que fiz ou sou, que fazem parte de mim.
ninguém saberia me contar verdadeiramente sobre mim, e me assusta pensar que se eu perdesse a memória, eu me perderia por completo.
por que eu ainda não contei tudo sobre mim? pelo menos o que importa? acho que tenho medo. e se me dissessem tudo ao meu respeito, eu me odiaria? me amaria?
eu sei que ninguém sabe mais de nós do que nós mesmo, mas ainda me apavora o fato de todo mundo só sabe da minha superfície. as pessoas só veem aquilo que eu mostro a elas, e não é nem uma fração do infinito que eu sou.
talvez por minha culpa, de ter medo de mostrar mais de mim, foi como eu disse em uma news aqui “estou sempre servindo pequenos shots de mim”. esse medo de que minha profundidade seja sufocante, faria com que minha existência fosse completamente erradicada, e com as memórias perdidas, eu me perderia pra sempre.
talvez fosse melhor viver a vida pelos olhos dos outros, depende de quem, mas falando das pessoas que me amam, eu acredito que elas veem uma versão melhor.
e se talvez fosse melhor apagar as memórias?
talvez a clementine estivesse certa em simplesmente apagar suas lembranças e talvez até si mesma.
me pergunto se há alguma essência que fica quando perdemos a memória? os sentimentos permanecem armazenados no coração?
acredito que há coisas sobre nós que não queremos lembrar, que preferíamos arrancar do nosso consciente e esquecer.
mas vale a pena?
tenho medo de um dia me perder, tenho mais medo ainda de nunca me reencontrar, mas tenho esperança de que meu coração guarde algum resquício de mim.
Já li um livro onde a protagonista acordava sem memória, a primeira página era ela acordando em uma praça e não lembrando de nada além do próprio nome. Era muito louco ver ela "aprendendo" sobre si mesma com as pessoas que nem sequer a conheciam de verdade, no fim, ela se tornou uma versão completamente diferente da antiga, e mesmo tendo alguns relances de memória doeu muito para ela perceber que tinha deixado até mesmo de amar as pessoas que amava antes. Ela estava sozinha no quarto pensando na situação estranha com o namorado (tinha virado ex) e pensou assim:
"Naquele momento percebi que nunca amei o Noah. E ele nunca me amou. Ele amava alguma outra Miranda, a que eu era antes. Eu tinha certeza que aquela Miranda o amava, mas eu não era mais aquela. Já era outra pessoa."
Nome do livro: A memória falsa
É um livro mais puxado para ficção científica, mas é simplesmente perfeito! É uma trilogia mas achei muito rápido de ler
Eu acho que nós, apesar de nos ver dentro de nós mesmo, somos os únicos a nos descrever com riqueza de detalhe. E é tão bom saber de si.