estou sempre errada, mesmo quando tudo que faço é ser eu.
minha fala é um erro. meu alimentar é um erro. meu jeito é um erro. nascer foi um erro.
em suplicas pergunto as estrelas: o que tão de errado tem em mim?
não há respostas diretas que cheguem do vasto infinito, então me contento com respostas inventadas de sinais que finjo receber. talvez começo errando ai.
não importa o quão esforçada eu me proponha a ser, o erro será o vencedor de qualquer batalha. minha fala é sempre alta, mesmo que explique que ouço pouco. meu sentir sempre é demais, mesmo que explique que sou intensa pelo meu transtorno. meu alimentar é demais e as vezes pouco demais, mesmo que eu explique que tenho transtorno alimentar. as pessoas condenam tudo e quaisquer coisa que eu sou e faça, mesmo que eu as explique que faço contra minha vontade de ser.
eu erro talvez ao me explicar. não se explica quem se é. se é e pronto.
me parecem desculpas esfarrapadas para persistir em ser errante, mas do que adianta se desculpar se não há compreensão. é mais fácil apontar o dedo quando é o outro que o recebe. só se percebe o erro de outro alguém quando nunca se olha pra si. o repúdio que você semeia vem do âmago de sua vontade ser.
o contrário do amor e do ódio é a indiferença. se gasta tanto tempo a observar meus minuciosos erros, talvez seja a sua vontade de ter a coragem de errar como eu.
não que me engrandeça ser um erro ambulante, mas talvez você queira gritar toda vez que me manda falar mais baixo, talvez você queira amar mais já que ninguém nunca te ensinou, talvez você queria comer o que quiser, já que sempre te proibiram de comer. talvez você perceba em mim erros, erros esses que você quer ser.
posso me enganar, posso até estar iludindo meu cérebro para que de certo modo não me doa. acreditar que é inveja ou admiração me parece melhor do que acreditar que no fundo eu sou apenas um erro constante.
eu erro por nunca ser o bastante, erro por estar sempre em débito com a eficiência, erro por flertar com a autocrítica e nunca me permitir andar pra frente. sempre indagada em palavras de solidão. vivendo um constante erro que nunca cessa, uma batalha árdua lutada sozinha no quarto escuro e silencioso que é meu cérebro.
falas vindas de sutilezas disfarçadas me ferem como pequenas adagas se fincando cada vez mais fundo em minha pele até que se rompa depois de ouvir mais uma vez que sou sendo demais. eu sou demais. não me culpe por você ser de menos.
talvez eu não seja um erro — talvez eu seja o erro de um mundo que não sabe lidar com quem não se disfarça. porque é isso que eu me recuso a ser: disfarce.
me visto de mim, mesmo quando não me entendo. mesmo quando não me aguento. porque não sei ser outra coisa além desse turbilhão que carrego no peito.
sou essa que você aponta como exagero.
mas quem disse que o amor, a fome, o medo, a vida… têm medida certa?
o meu é errar são rochas duras que se partem com facilidade depois de vistas por muito tempo. erro mais ainda ao acreditar nas palavras daqueles que observam fragmentos do meu ser e que jamais se prontificaram a mergulhar além da superfície.
não quero mais traduzir o que sou em uma linguagem que não me pertence e nem me explicar em frases que cabem nos outros, mas não cabem em mim.
às vezes me pergunto o que aconteceria se a gente aprendesse, desde cedo, que não existe forma certa de ser. que sentir demais não é fraqueza. que falar alto pode ser beleza. que querer amor não é carência, é ato de coragem.
o que vem depois de perceber que erro? falo baixo? não faço nada que não lhe desagrada. e desagradar quem? quem tem tanto tempo assim de me reparar? eu paro de sentir? paro de ser?
se ser eu é um erro. o que devo fazer? não ser? não sei ser outro alguém. eu só sei ser eu.
Que texto profundo e necessário para se ler às 9h da manhã de um sábado. Eu me identifico porquê sou assim também, sempre me achei muito intensa em tudo que faço e isso as vezes é estranho para outras pessoas. Ou me acham muito emocionada ou estão falsa, não é estranho para mim, saber de pessoas que não gostam de mim sem ao menos me conhecerem. Mas aprendi a conviver com isso, nós devemos viver sendo quem somos, sem nenhum tipo de amarras. Temos de ser felizes.
Como dizia Macabéa, "Já que sou, o jeito é ser". 💙