não me reconheço, me sinto impostora de mim.
vamos começar dizendo o que de fato é síndrome de impostor:
“a síndrome do impostor (si) é um transtorno psicológico que se caracteriza por uma constante dúvida sobre as próprias capacidades e conquistas. pessoas com si acreditam que não merecem o sucesso alcançado e que suas realizações são fruto de sorte ou ajuda de terceiros. o principal sintoma é o medo de ser desmascarado, o que pode desencadear ansiedade e angústia.”
sabemos que não estamos sozinhos nessa jornada, uma meta-análise de 108 estudos confirmou que mulheres vivenciam a síndrome de impostora com mais frequência e intensidade do que os homens. em parte, porque o mundo cobra demais delas e reconhece de menos. em 16 de 33 estudos revisados pela revista você s.a., mulheres apresentaram níveis significativamente mais altos do fenômeno.
trouxe dados científicos para mostrar que nenhuma experiência é individual, como bem sabemos.
sempre me sinto uma fraude em minhas conquistas, muitas vezes sinto certa distância dela, como se fosse uma vitória de outra pessoa.
geralmente me sinto altamente desconectada das emoções de merecimento. aprecio muito minhas conquistas, mas sinto que não são minhas. isso faz algum sentido?
saber que há tantas pessoas como eu deveria me dar um alívio, mas só sinto mais lamentações.
está todo mundo fingindo?
há muitos filmes que retratam de forma sutil a síndrome de impostor, em o diabo veste prada a personagem andrea sachs possui esse inferno pessoal, ela se sente pouco merecedora e deslocada de onde ela está, por isso ela passa a se moldar e fingir que tudo aquilo é natural a ela.
o ambiente hostil de seu atual trabalho contribui significativamente para que ela duvide ainda mais de sua capacidade. sua chefe a pressiona ao ponto dela duvidar de qualquer mínima atitude, minando aos poucos sua essência e sua percepção sobre si, gerando assim uma necessidade de se tornar uma impostora.
a maioria das pessoas se tornam impostoras por conta do meio em que estão inseridas, ainda é mais comum em trabalhos, podendo dizer que está relacionado ao meio acadêmico.
outro grande exemplo é nossa queridíssima rory gilmore. apesar de não ser tão explícito, podemos notar a mudança de personalidade gritante da rory.
desde pequena, rory foi tratada como alguém destinada ao sucesso. a menina prodígio de stars hollow. a que tirava notas altas, que lia três livros por semana, que entraria em harvard. o problema é que, quando o mundo começa a cobrar o que sempre esperou dela, rory se perde.
na fase adulta, onde tudo se torna mais real e cruel, faz com que ela passe a evitar encarar a realidade, pulando de um projeto a outro, sempre esperando alguém validar o que ela mesma não consegue enxergar em si.
essa é uma das faces mais cruéis da síndrome de impostora: quando você tem tudo para dar certo, mas duvida tanto da sua capacidade que começa a se autossabotar.
a rory adulta não fracassa por falta de talento. ela fracassa porque não acredita que é suficiente, e essa dúvida interna é paralisante.
andrea sachs e rory gilmore têm tudo para serem protagonistas de suas próprias vidas. ambas são inteligentes, articuladas, determinadas. mas, curiosamente, se perdem ao tentar se encaixar num mundo que não parece feito para elas. e é aí que a síndrome de impostora começa a sussurrar: será que eu sou boa o suficiente? será que eu mereço estar aqui?
andy e rory vivem extremos diferentes da mesma angústia.
e talvez esse seja o maior veneno da síndrome de impostora: fazer mulheres brilhantes acreditarem que só chegaram onde estão por sorte, aparência ou simpatia. nunca por mérito. nunca por serem incríveis de verdade. sempre precisando forçar para se encaixar e pertencer.
sinto que não há escapatória.
não há para onde fugir quando estamos destinadas a sempre nos sentir um fracasso?
a verdade é que estou cansada. cansada de tentar me encaixar, cansada de performar segurança, cansada de fingir que não dói duvidar de si o tempo todo.
porque não é só sobre insegurança, é sobre ser engolida por um sistema que nunca quis te ver inteira, ainda mais se for mulher.
é sobre trabalhar o dobro para receber metade.
é sobre se esforçar para parecer confiante quando, por dentro, tudo grita: vão descobrir que eu não sou tudo isso.
inclusive, sinto esse pavor ao escrever essa newsletter. penso que vocês, leitores, irão descobrir que sou vazia e nada sei do que estou falando, que um dia vão me ler e dizer que minhas palavras nem fazem algum sentido.
a síndrome de impostora não é um defeito pessoal. é sintoma de um mundo que faz questão de te fazer sentir menor. e o pior é que funciona.
tenho a consciência amarga de que estamos exaustas. fartas de sermos empurradas para dentro de uma espiral de autocrítica e depreciação. e mesmo assim, a gente continua. não porque acredita. mas porque não tem escolha. não dá para fugir de si.
então talvez o que reste seja correr até um lugar onde fingir não doa tanto. até que a gente olhe no espelho e o reflexo, enfim, seja um rosto conhecido.
eu nunca tinha parado pra pensar em como a rory REALMENTE tem síndrome do impostor, até ler esse texto! você conseguiu descrever perfeitamente e com uma clareza absurda o que eu sinto e nunca consegui expressar nem com a minha psicóloga, então COM CERTEZA seu texto me ajudou a entender mais sobre mim mesma de uma forma que nenhuma pesquisa nunca conseguiu!! amei demais, já quero mais conteúdos como esse... sucesso, lele :)
É muito louco porque eu amo demais todos os seus textos e acho a sua escrita maravilhosa e ainda sim vc se sente assim. quando eu me sentir incapaz vou tentar lembrar de ti princesa, se eu for 1% do que és tenho certeza que sou boa também 🥹